...E assim vêdes, meu Irmão, que as verdades
que vos foram dadas no Grau de Neófito, e
aquelas que vos foram dadas no Grau de Adepto
Menor, são, ainda que opostas, a mesma verdade.(*)
Do Ritual Do Grau De Mestre Do Átrio
Conta a lenda que dormia
Uma Princesa encantada
A quem só despertaria
Um Infante, que viria
De além do muro da estrada.
Ele tinha que, tentado,
Vencer o mal e o bem,
Antes que, já libertado,
Deixasse o caminho errado
Por o que à Princesa vem.
A Princesa Adormecida,
Se espera, dormindo espera,
Sonha em morte a sua vida,
E orna-lhe a fronte esquecida,
Verde, uma grinalda de hera.
Longe o Infante, esforçado,
Sem saber que intuito tem,
Rompe o caminho fadado,
Ele dela é ignorado,
Ela para ele é ninguém.
Mas cada um cumpre o Destino
Ela dormindo encantada,
Ele buscando-a sem tino
Pelo processo divino
Que faz existir a estrada.
E, se bem que seja obscuro
Tudo pela estrada fora,
E falso, ele vem seguro,
E vencendo estrada e muro,
Chega onde em sono ela mora,
E, inda tonto do que houvera,
À cabeça, em maresia,
Ergue a mão, e encontra hera,
E vê que ele mesmo era
A Princesa que dormia.
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Cuenta la leyenda que dormía
Una Princesa encantada
A quien sólo despertaría
Un Infante, que vendría
Desde más allá del muro del sendero.
Él tenía que, intentado,
Vencer el mal y el bien,
Antes que, ya libertado,
Dejara el camino equivocado
Por el que a la Princesa vino.
La Princesa Adormecida,
Se espera, durmiendo espera,
Sueña en muerte su vida,
Y órnale la cabeza olvidada,
Verde, una girnalda de hiedra.
Lejos el Infante, esforzado,
Sin saber que fin(**) tiene,
Rompe el camino predestinado,
Él de ella es ignorado,
Ella para él es nadie.
Pero cada uno cumple el Destino
Ella durmiendo encantada,
Él buscándola sin tino
Por el proceso divino
Que hace existir el sendero.
Y, si bien que sea oscuro
Todo por el sendero lo fuera,
Y falso, él viene seguro,
Y venciendo sendero y muro,
Llega adonde en sueño ella vive,
Y, aún tonto de lo que hubiese,
A la cabeza, en maresía(***),
Ergue la mano, y encuentra hiedra,
Y ve que él mismo era
La Princesa que dormía.
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Publicado pela primeira vez in Presença,
n.os 41-42, Coimbra, maio de 1934.
Fernando Pessoa
1934
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(*) Acerca da epígrafe que encabeça este poema diz o próprio autor a uma interrogação levantada pelo crítico A. Casais Monteiro, em carta a este último:
"A citação, epígrafe ao meu poema "Eros e Psique", de um trecho (traduzido, pois o Ritual é em latim) do Ritual do Terceiro Grau da Ordem Templária de Portugal, indica simplesmente - o que é fato - que me foi permitido folhear os Rituais dos três primeiros graus dessa Ordem, extinta, ou em dormência desde cerca de 1888. Se não estivesse em dormência, eu não citaria o trecho do Ritual, pois se não devem citar (indicando a origem) trechos de Rituais que estão em trabalho"
[In VO/II.]
(**) N.d.T: Es un triple sentido, pero esta es la acepción que más cuaja en el contexto; puede ser intuido o también intento.
(***) N.d.T: Maresía: Olor del mar... ¿alguien sabe alguna palabra sinónima en castellano?
Na Ordem Templária De Portugal)
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