Analistas consideram que prioridades distintas dos blocos regionais africanos e resistência dos países do G6, incluindo Moçambique, em relação às taxas aduaneiras, podem dificultar aplicação do Acordo de Livre-Comércio.A fase operacional do Acordo de Livre-Comércio Continental Africano foi lançada durante a cimeira de chefes de Estado e de Governo da União Africana, que terminou esta segunda-feira (08.07), em Niamey, no Níger. A aplicação deste acordo representará um mercado de 1,2 mil milhões de pessoas e será gerido por cinco instrumentos operacionais: definição das regras de origem dos produtos, fórum de negócios online, monitorização e eliminação de barreiras aduaneiras, sistema de pagamentos digitais e criação do Observatório de Comércio Africano. O lançamento da fase operacional acontece numa altura em que 27 países ratificaram o acordo, assinado agora por 54 dos 55 países da União Africana, depois de a Nigéria, a maior economia do continente, ter assinado e ratificado o documento no decorrer da cimeira. A União Africana está otimista e acredita que irá levar a um aumento de 60% do comércio dentro do continente até 2022. No entanto, o professor Prosper Honest Ngowi, da Universidade de Mzumbe, na Tanzânia, aponta "grandes desafios” para o sucesso do Acordo de Livre-Comércio em África, "por causa dos atuais blocos regionais - da África Austral (SADC), África Ocidental (CEDEAO), Central (CEMAC) e Oriental (EAC)". "Cada um tem as suas prioridades. Por exemplo, os países da África Oriental darão prioridade à sua região e só depois à zona de livre comércio africana. Embora África seja uma só, ela não está unida", considera o especialista. "Creio que primeiro devemos fortalecer os blocos regionais e, quando estes forem fortes o suficiente, podem tornar-se uma avenida em direção a um bloco comercial continental". Resistência aos impostos O ministro dos Negócios Estrangeiros do Togo e atual presidente do Conselho de Paz e Segurança da União Africana, Robert Dussey, está satisfeito com o lançamento da fase operacional do acordo de livre-comércio africano. Em entrevista exclusiva à DW, no entanto, admite que ainda há desafios no sentido de convencer alguns países sobre o papel deste acordo em relação à redução de taxas aduaneiras. Estes países formam o chamado G6, que integra algumas nações da África Austral, incluindo Moçambique e Madagáscar, que, segundo o ministro togolês "não estão prontos para cobrar impostos sobre produtos como o petróleo e fertilizantes". "Esses países podem ter grandes dificuldades se aumentarem os impostos sobre seus primeiros produtos de exportação. E precisam aceitar esta dinâmica do acordo de livre-comércio", frisa. De acordo com o ministro togolês, uma equipa técnica da União Africana discutirá com estes países outras formas de lucrar com outros bens e serviços. Além das questões regionais e económicas que podem dificultar o sucesso da zona de livre comércio criada pela União Africana, especialistas apontam ainda outro obstáculo - as infraestruturas dos países africanos. "Um desafio que se põe é melhorar a nossa infraestrutura, a segurança do espaço aéreo, melhorar os caminhos de ferro, as estradas. Já há projetos em execução no continente, melhorando a integração. E para isto, precisamos combater a corrupção", explica Aisha Laraba Abdullahi, antiga encarregada para Assuntos Políticos da União Africana. Reforçar direitos Aisha Laraba Abdullahi não deixa de reconhecer que o acordo alcançado pela União Africana – o maior desde a criação da Organização Mundial do Comércio, em 1994 – é um marco para o desenvolvimento africano, com potencial para melhorar índices sociais, como o acesso à saúde e educação – que ainda são baixos na maioria dos países. Em termos sociais, outro desafio: o papel das mulheres e da juventude, destaca a vice-secretária-geral da ONU, Amina Mohammed, sublinhando que é preciso reforçar a educação dos jovens e assegurar o direito das mulheres, após a assinatura do Acordo de Livre-Comércio. "Devemos garantir a educação e devemos apoiá-los no comércio e enfrentar o que os impedem de obter os seus direitos. Isso deve começar de país para país até se espalhar pelo continente", afirma.
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